A Representação do Negro na Revista Nosso Amiguinho - Parte 2: O negro nas histórias em quadrinhos e artes gráficas
[Leia a parte 1 aqui]
Continuando com as postagens referentes ao artigo a respeito da representação do negro na revista Nosso Amiguinho, que escrevi para o Adventcom (I Congresso Adventista Norte-Americano de Pesquisadores em Comunicação), hoje veremos como o negro vem sendo representado no humor gráfico e histórias em quadrinhos através da história e como essa imagem se construiu.
Isso aqui é um resumão do que foi pesquisado, aconselho a consultar os links nas referências bibliográficas se quiser saber com mais detalhes, especialmente o trabalho do Dr. Nobuyoshi Chinen que faz um levantamento fantástico.
Continuando com as postagens referentes ao artigo a respeito da representação do negro na revista Nosso Amiguinho, que escrevi para o Adventcom (I Congresso Adventista Norte-Americano de Pesquisadores em Comunicação), hoje veremos como o negro vem sendo representado no humor gráfico e histórias em quadrinhos através da história e como essa imagem se construiu.
Isso aqui é um resumão do que foi pesquisado, aconselho a consultar os links nas referências bibliográficas se quiser saber com mais detalhes, especialmente o trabalho do Dr. Nobuyoshi Chinen que faz um levantamento fantástico.
A análise de Valdecir de Lima Santos (2014) da imagem do
negro nas histórias em quadrinhos, destaca a escassez de personagens
significativos e como as dinâmicas das representações sociais estereotipadas
nessa arte ajudaram a construir uma cultura e dizer que ela é universal quando,
na verdade, “as bases que a solidificam utilizaram apenas, para sua composição,
uma percepção de mundo eurocêntrica, excluindo negros e outros grupos étnicos
da sua representação” (p. 24, negrito acrescentado).
Por sua vez, Chinen (2013) destaca em sua análise
qualitativa da representação da imagem do negro, que as representações da etnia
nos primórdios do humor gráfico foram baseadas nas figuras dos menestréis, que era
o “papel de bufão, do comediante tolo e desengonçado interpretado por negros”
que, como retratado em diversas pinturas do século XIX, proviam entretenimento
e diversão para os brancos, fosse como músicos, dançarinos ou cantores e sempre
como criados. Essa figura ficaria tão popular que “artistas brancos passaram a
se apresentar às plateias com o rosto pintado de preto e uma área branca ao
redor da boca para exagerar o contorno dos lábios” (p.47), o que conhecemos hoje como blackface. Essa representação
exagerada e cômica do negro “marginal” foi a imagem que se
tornou “popular nos Estados Unidos” (p.47) e passou a ser veiculada na mídia
impressa (p. 48), perpetuando e popularizando a imagem ridicularizada do negro
com a cabeça representada por uma elipse simples, “olhos esbugalhados e lábios
exageradamente grossos, como faziam os menestréis com sua maquiagem” (p.49).
Chinen analisa a iconografia do negro no Brasil antes do surgimento dos
quadrinhos e observa como as imagens ora eram realistas, ora exageravam nos
traços que diferenciavam os negros dos brancos (p. 64). Para ele, é importante
destacar a origem dos quadrinhos como sendo a caricatura e o humor gráfico satírico.
Ele utiliza Freud para argumentar que “rir do outro é [...] a maneira
civilizada de agredi-lo, uma vez que a sociedade e seus códigos morais impedem o indivíduo de se manifestar como bem
entender” (CHINEN, 2013, p.78).
Assim, não seria surpreendente constatar a veia racista nas
charges que envolviam negros na época de escravidão, embora Chinen (2013)
observe que os caricaturistas/chargistas com inclinações abolicionistas eram
mais sutis na representação do negro (p. 95-96). Dentre estes se encontrava
Benedito, o criado do famoso personagem Nhô-Quim de Angelo Agostini, criado em
1869, que possuía cunho caricato. Apesar disso, Chinen destaca que não há nos
traços de Benedito “algo muito exagerado ou que se aproxime do estereótipo de
representação dos negros que viria a se impor como padrão nos anos seguintes
nos quadrinhos nacionais” (p.118). Benedito é considerado, por muitos, o
primeiro personagem negro fixo a figurar nos quadrinhos brasileiros, embora alguns
discutam se as charges de Agostini sejam realmente histórias em quadrinho
(p.117).
Focando nos
quadrinhos cômicos como os conhecemos, Chinen (2013, p. 121) salta para 16 de
outubro de 1907, quando o personagem negro Giby estreou nas páginas da revista O Tico-Tico (que, anteriormente, já
trouxera uma história explicando a Lei Áurea para as crianças, pelas mãos do
próprio Agostini). Giby era o criado da família do personagem principal da
história. Embora já duas crianças negras já houvessem aparecido nas páginas de O Tico-Tico, filhas da cozinheira do
personagem principal, Giby foi quem se popularizou e já carregava os traços
exagerados herdados nos Estados Unidos pela figura caricaturizada do menestrel.
Chinen observa também o fato curioso de que “o termo ‘gibi’, que se tornou
sinônimo de revista em quadrinhos no Brasil, no sentido original significa
menino ou moleque negro” (p. 103) e foi o nome dado a um personagem mascote da
revista Gibi, que circulou entre 1939 e 1954, depois num período curto nos anos
1970 e veiculava histórias em quadrinhos que, ironicamente, nem sempre incluíam
seu personagem título (p.104). O termo também era “a denominação comum a
meninos que vendiam jornais nas ruas ou faziam a função de entregar recados”
(CHINEN, 2010, p. 68).
Chinen fala sobre as teorias pseudocientíficas racistas que
compararam os negros a macacos como influência para que alguns casos extremos
também aproximassem o negro do animalesco (p. 61). Na conclusão do seu
trabalho, ele destaca que, por décadas seguidas, a representação gráfica do
negro esteve atrelada ao estereótipo dos menestréis e que, embora “não haja uma
relação direta entra os desenhos feitos por brasileiros e os americanos,
características comuns [...] permitem constatar que essa influência é
recorrente em ambos” (CHINEN, 2013, p. 263). Ele também sublinha o fato de que
a presença do negro nos quadrinhos brasileiros é historicamente escassa “e são
ainda mais escassas histórias nas quais eles são os protagonistas, ou nas quais
não desempenham um papel subalterno” (p. 263), como escravos, empregados e
personagens submissos - quando não "vagabundos" e preguiçosos.
Em resumo:
Apenas recentemente, o cuidado em relação à representação dos negros tem sido pensada e repensada, depois de décadas de discussões acadêmicas e leigas que apontam que, desde sempre, a imagem do negro tem sido baseada em pressupostos racistas e bases estereotipadas.
Levando em consideração o texto anterior, onde discutimos como a cultura dentro das representações é importante para estabelecer o valor das coisas na mente da sociedade, especialmente crianças e adolescentes, essa representação do negro como mostrada por Chinen e Lima tem sido prejudicial para a imagem deste perante a sociedade.
Referências:
CHINEN, N. O papel
do negro e o negro no papel: representação e representatividade dos
afrodescendentes nos quadrinhos brasileiros. Universidade de São Paulo, 2013.
Disponível em <http://bit.ly/2vu5Gd4>. Acesso em: 23 de jun. 2017.
_________. A construção do preconceito na representação dos
negros nos quadrinhos. 9ª arte:
revista brasileira de pesquisas em histórias em quadrinhos. São Paulo, v. 2,
n.2 74-90, 2º sem. 2013. Disponível em < http://bit.ly/2v1e9nk>. Acesso
em: 23 de jun. 2017.
_________. A imagem do negro no humor gráfico brasileiro do
século XIX até meados do século XX. Via
Atlântica, São Paulo, n.18, 57-75, dez. 2013. Disponível em <http://bit.ly/2wbq68q>.
Acesso em: 23 de jun. 2017.
SANTOS, V. de L. Com
que cor se pinta o negro nas histórias em quadrinhos? Universidade da
Bahia, 2014. Disponível em <http://bit.ly/2vuspFX>. Acesso em: 25 de jun.
2017.
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